Direito à desconexão em tempos de teletrabalho

 

O direito à desconexão consiste no direito de o empregado poder usufruir de seu tempo fora do trabalho para dedicar-se atividades pessoais, ficar com a família, fazer atividades físicas, tirar um tempo para si, etc. Esse direito tem ficado cada vez mais ameaçado pelo trabalho dentro de casa. Quando o quarto ou a sala de estar se tornam escritório, é mais difícil se desligar completamente do trabalho em horários fora do expediente. Referido direito, já regulado por outros países, tem ganhado cada vez mais importância no Brasil, sobretudo devido a pandemia do covid-19, que exigiu profundas alterações nas relações de trabalho.

Além da dificuldade dos empregados em se desconectar, os empregadores também enfrentam o problema de não conseguirem monitorar o tempo de trabalho e até mesmo as condições em que está sendo realizado. Alerta à realidade atual, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) indicou o direito à desconexão, por meio de um relatório publicado em janeiro de 2021, que convoca os governos, trabalhadores e sindicatos a adotarem medidas específicas para assegurar a visibilidade e privacidade do empregado.

Ainda inexiste previsão específica na legislação trabalhista brasileira, porém há no Congresso alguns projetos de lei com esse tema. O teletrabalho também entra na discussão, pois não prevê direito a hora extra sob entendimento de que a empresa não tem como controlar a jornada. Consultado sobre o tema, o advogado Rafael Salmeron afirma que “a Declaração Universal dos Direitos Humanos, em respeito aos direitos e liberdades, proclama há décadas que toda pessoa tem direito a repouso e lazer, e inclusive à limitação razoável das horas de trabalho e férias periódicas remuneradas”. E completa: “a nossa Constituição Federal de 1988 igualmente declara que o bem-estar e os direitos sociais, a exemplo da saúde e o lazer, devem ser assegurados em nosso País”.

Com a pandemia, o direito ao descanso ganhou novos contornos. A Medida Provisória 927, editada em março de 2020, trouxe um capítulo exclusivo para regulamentar o teletrabalho. O parágrafo 5º, inclusive, afirma que o tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou coletivo”. A MP perdeu a vigência em julho, mas o teletrabalho segue regulamentado pela CLT desde 2017.

Importante dizer que a saúde mental dos empregados vem sendo um dos principais motivos para a promoção de novas adequações no teletrabalho. Trata-se de tema recente, ainda não muito questionado ou discutido na justiça do trabalho, pois além de se tratar de novidade, os trabalhadores provavelmente estão ponderando o risco de desemprego que um possível processo poderia acarretar nesse momento.

Em linha com a necessidade de garantir o direito à desconexão e, também, ao lazer, já existem dois projetos de lei na Câmara dos Deputados: o PL 4931/2020, que regulamenta alguns pontos do teletrabalho e prevê o direito à desconexão “a fim de garantir o respeito dos períodos de descanso e férias, bem como a intimidade pessoal e familiar do empregado”; e o PL 5581/2020, que sugere que as empresas com mais de 50 empregados devem adotar “políticas internas educativas para orientação a seus empregados e gestores quanto à importância da desconexão e de boas práticas de etiqueta digital”. Ainda não há previsão de quando serão votados.

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